29 maio 2015

MOVIMENTO X ESTAGNAÇÃO

O ser humano sente-se seguro com a rotina, afirma o filósofo Heidegger. Porém, essa mesma rotina pode nos tornar insatisfeitos ou, em alguns casos, doentes. Não é raro ouvirmos alguém se lamentar da mesmice em que sua vida se encontra e não saber o que fazer para mudar.
Se, como afirma o filósofo, nos sentimos confortáveis com a rotina, por que ela acaba por nos deixar tão desalentados? O que significa esse paradoxo? Ainda na filosofia de Heidegger encontramos que o ser humano busca a rotina para se sentir seguro diante da incerteza em que se encontra por não ter garantias, nem mesmo a de que estaremos vivos amanhã. Isto é, nos baseamos numa (in)certeza e em virtude disso fazemos planos. Porém, não há como saber com total acerto se tudo será da forma como esperamos. Mas, ainda assim não deixamos de fazer planos e isso nos mantém vivos.
Então, a rotina nos “autoriza” a acreditar que estaremos bem amanhã para ao menos cumpri-la. Ou nos permite um envolvimento com ela, de tal de modo, que o pensar em nossas incertezas fica para um plano menos relevante. E, assim nos coloca numa posição, ao menos por algum tempo, confortável. Mas não é essa mesma rotina que pode nos levar ao adoecimento, à tristeza ou ao desânimo?
Quando nos habituamos a alguns comportamentos tendemos à estagnação. Essa ausência de movimento impede nosso desenvolvimento. Sempre que experimentamos algo novo podemos sentir algum desconforto, mas após algum tempo uma sensação de vitalidade pode nos envolver e isso significa que estamos em movimento. Isto é, saímos da situação de conforto e nos colocamos em risco. Desse modo, ao nos movimentarmos há um risco porque não temos garantias. Continuamos, contudo, sempre em busca de certezas.
Então, essa insegurança que a incerteza proporciona está relacionada ao movimento que nos coloca em situação de vitalidade o qual permite nosso desenvolvimento e crescimento. Assim, ao buscar maneiras de nos movimentar, ou seja, ao arriscarmos o novo, também investimos em nosso aprimoramento pessoal.
Sempre que nos permitimos esse investimento em nosso crescimento corremos o risco de obtermos realizações inesperadas. Ou seja, sairmos da estagnação a qual tendemos e nos movimentarmos. Isso exige de nós iniciativa e vontade. Mas, também nos leva ao desenvolvimento que almejamos.

Márcia A. Ballaminut Cavalieri
Psicóloga CRP 06/95124

22 maio 2015

FRUSTRAÇÕES

Não estamos acostumados a lidar com frustrações. Porém, elas fazem parte de nosso dia-a-dia, mesmo ao desejarmos não nos vermos contrariado ou impedido de fazer algo muito desejado ou mesmo, assistir alguém ter um comportamento que não concordamos e o qual não temos como impedir.
Muitas pessoas buscam tratamentos médicos para ansiedades, iras incontroladas, acessos de raiva ou mesmo angústia sem falar nas síndromes, como o pânico. Busca-se nos medicamentos disponíveis a solução para as dores que acompanham as frustrações. Mas o fato é, apesar do sofrimento que elas proporcionam também propiciam nosso desenvolvimento emocional.
Percebe-se, nos dias de hoje, uma tentativa de distanciamento com relação a sentimentos e emoções. Desde cedo buscamos nos poupar das contrariedades como se fossem algo extremamente prejudicial ao nosso existir. Contudo, nos esquecemos da importância de se conhecer a dor para que se possa buscar, com ardor, não senti-la.
Entretanto, aprendemos tanto a fugir da dor que nos esquecemos de vivê-la no momento em que ocorre, para que, assim, possamos tirar proveito da situação em que estamos envolvidos e podermos fortalecer nosso potencial emocional. E, então, lidar com as dificuldades diárias que fazem parte do nosso viver.
Até que ponto agimos da melhor maneira ao nos pouparmos dos males diários presentes no risco em estar vivo? E, além disso, podemos nos preocupar em poupar todos aqueles que fazem parte de nossa responsabilidade como filhos e cônjuges. Na justificativa do amor nos sentimos no direito de “impedir” o sofrimento daqueles a quem amamos e talvez impedimos que se desenvolvam.
Mas esse comportamento pode sufocar quem pretende ser a “barreira” contra as mazelas do mundo, e, proporcionar a sensação de falha, trazendo à tona a frustração. Com certeza essa também possibilita o crescimento emocional. Contudo, em alguns momentos, precisamos de auxílio para entender o que nos leva a ter atitudes como essa. E principalmente, para sermos capazes de detectar esse tipo de comportamento em nosso padrão e então podermos nos poupar de um desgaste inútil e desnecessário.

Márcia A. Ballaminut Cavalieri
Psicóloga CRP 06/95124

E-mail: marciabcavalieri@hotmail.com

15 maio 2015

SENTIR

Alguém afirmou que após experimentar a paternidade passou a ter muito mais medo de sua morte. Sentindo-se responsável pelo filho recém nascido assustava-o a idéia de não estar presente quando esse filho pudesse precisar de ajuda ou orientação.
Muitos pais compartilham este sentimento, entretanto, quão seguro nos sentimos sendo ou não pais? O filósofo Heidegger argumenta sobre nosso destino à morte. Contudo, se nos sentirmos amedrontados por essa possibilidade poderemos conhecer o que é comum ser chamado de “morte em vida”, descrevendo assim alguém com medo da vida por saber que pode morrer.
Isso ocorre quando deixamos de nos arriscar. Para continuar vivo o ser precisa colocar-se em situação de risco. Para morrermos precisamos de um único e simples requisito – estarmos vivos. Ora, se eu estou escrevendo e você lendo, significa que temos esse único e simples requisito.
Algumas perguntas podem emergir então: como nos sentirmos vivos? Como nos arriscarmos? É realmente seguro continuarmos com os comportamentos que nos permitem continuar as mesmas experiências, já conhecidas por nós e as quais não oferece mais risco e nem insegurança?
Muitas vezes lemos um livro, vemos um filme ou ouvimos uma história de alguém que se arriscou,  se aventurou e fracassou. Porém, nessas histórias as pessoas que arriscaram persistem e em algum momento obtêm êxito e, por conseguinte, se comprazem diante da satisfação. Essas pessoas afirmam que os sentimentos experimentados quando isso acontece não inúmeros e impossíveis de serem descritos em sua exatidão.
Sendo assim, talvez fosse o momento de iniciarmos uma busca pelo novo, para assim conhecermos o risco e sentirmos o “sangue circular em nossas veias”. Quem já não experimentou um calor pelo corpo inteiro, uma vermelhidão no rosto, mãos suadas e frias, o famoso friozinho na barriga quando diante de uma situação nova. Neste momento será que a sensação não era a de sentir-se vivo?
Em uma apresentação quando um palestrante falava sobre seu tema, este fez um comentário referindo-se a um antigo locutor esportivo, Osmar Santos, o qual afirmava que se algum dia deixasse de sentir o friozinho na barriga enquanto praticava seu trabalho, ele deixaria a profissão e buscaria outra a qual lhe proporcionasse tal sensação. Porque, para ele, o friozinho na barriga significava que sua atividade ainda lhe proporcionava a sensação de estar vivo e era isso o mais importante.
Quantas vezes nos sentimos desanimados, ou depressivos como é tão comum afirmarmos atualmente. Mas não caberá a nós mesmos buscarmos meios para mudarmos essa sensação? Seja numa empreitada profissional nova, ou mesmo em uma breve caminhada por um parque. O importante é: seja qual for a direção de nossa opção, que ela nos proporcione o sentir. Pois, quando sentimos nos colocamos numa situação de contato com o mundo e com quem está próximo de nós, e ela pode no mínimo nos surpreender. O importante é oferecermos a nós mesmos essa possibilidade de sensações, seja no trabalho, na família, no círculo de amizades ou mesmo em um tratamento novo para solução de um mal estar antigo. Mas seja qual for a opção que ela nos possa nos fazer... Sentir.

Márcia A. Ballaminut Cavalieri
CRP: 06/95124

E-mail: marciabcavalieri@hotmail.com

08 maio 2015

TROCAS

Nem sempre atentamos para a amplitude do significado da palavra troca. Em um primeiro momento podemos pensar em trocar algum objeto antigo por um novo, uma roupa, um sapato, um carro ou mesmo a pintura de uma casa. Enfim, podem-se trocar muitas coisas e, dessa maneira, ter algo novo.
A troca de um objeto por outro geralmente proporciona satisfação. Até porque há algo novo envolvido e a novidade normalmente causa, ao menos, algum movimento, mesmo que seja “apenas” uma emoção.
Entretanto, a troca que gostaria de expor é aquela a qual envolve o contato de um ser com outro. Ao nos aproximarmos de alguém há sempre a possibilidade de uma troca. Algumas pessoas se entregam ao carinho de um bicho de estimação devido às poucas solicitações que ele faz. Em troca do carinho que ele lhe dispensa, em um primeiro momento, talvez ocorra a solicitação de um pouco de comida, água ou uma pequena parte de seu tempo.
No contato com outra pessoa, porém, há mais trocas envolvidas e uma questão a se fazer é o quanto estamos dispostos a “doar” em troca do que recebemos quando nos relacionamos com alguém?
É comum, nos dias atuais, nos lamentarmos do pouco tempo para nos envolver mais na vida daqueles que fazem parte de nosso círculo de convivência. Normalmente, quando não estamos bem, procuramos quem possa nos ouvir, amparar e acolher na ânsia de melhorarmos nossas dores e assim nos restabelecermos para continuar nosso caminho.
Contudo outra questão emerge: o quanto estamos dispostos a atentarmos àqueles ao nosso redor e ampará-los, ouvi-los ou acolhê-los num momento de fragilidade?
Os compromissos diversos, a falta de talento, um jeito de ser mais indiferente podem justificar nosso desinteresse pelo outro e por seus sentimentos. Mas até que ponto somos capazes de estabelecer esse tipo de contato com os outros e não nos sentirmos vazios em algum momento de nossa existência. O imediatismo e a velocidade da vida atual nos leva a acreditar sermos imunes e que tais sentimentos não nos alcançarão.
Quando nos distanciamos dos relacionamentos que podem solicitar um pouco mais de nossa disposição e investimento, podemos experimentar algumas sensações nem sempre confortáveis.
Sempre que nos permitirmos o ir e vir da troca, poderemos perder um pouco. Em contrapartida correremos um risco muito grande de nos relacionarmos de modo mais pleno e experimentar sentimentos que nos completem de modo surpreendente.

Márcia A. Ballaminut Cavalieri
Psicóloga CRP 06/95124

Email: marciabcavalieri@hotmail.com

01 maio 2015

SOFRIMENTO

Vive-se hoje a valorização do temporal, do efêmero, do passageiro, que nos leve ao prazer a qualquer custo. A busca da satisfação não tem preço. Desde a mais tenra idade somos “induzidos” a sermos ágeis e rápidos no pensar e agir. Quanto mais afinados com esses princípios mais possibilidades de sucesso nos é prometido.
Assim, acreditamos nos tornarmos totalmente livres e escolhermos o que quisermos, não atentamos para a possibilidade de estarmos nos escravizando às solicitações do mundo e nos generalizando.  Agindo assim, nos tornamos uniformes no que tange aos desejos e conquistas. Porém, somos singulares. Cada um de nós tem seu tempo e velocidade para agir, pensar e elaborar.
Na corrida para alcançarmos o prometido sucesso, deixamos de lado o pensar. Pensar sobre nós, nossa existência, nossos companheiros, nossos familiares, nossos sonhos e desejos, nossos dissabores, etc.
O poder escolher representa nossa liberdade, entretanto também nos amedronta. Pois, ao assumirmos nossa liberdade em optar assumimos também as consequências dessas escolhas e a responsabilidade consequente a elas.
Ana Maria Feijó, psicóloga, destaca em seu livro “Interpretações fenomenológico-existenciais para o sofrimento psíquico na atualidade”, que as enfermidades as quais afligem nosso psiquismo na atualidade, são marcadas pelo excesso e pela urgência diante das oportunidades do mundo. Deve-se viver intensamente, aproveitando tudo e todo o tempo para que não haja desperdício deles. Diante disso, pode-se deparar com a insistência em aproveitar tudo ou a desistência por não ser capaz de alcançar seu máximo e usufruir de “todas” as possibilidades disponíveis. Daí, o sofrimento se manifesta de diversas maneiras.
Rotular o sofrimento humano torna-se indispensável. Síndromes e transtornos com nomes suntuosos e extensos faz com que nos sintamos integrados. Contudo, se nos dispusermos a relembrar que somos livres para escolher, poderemos optar por lidar de um modo diferente do usual com nossos limites, os quais se tornam evidentes quando de nossos sofrimentos diversos.
Sendo assim, quando atentamos para quem somos e como lidamos com nossas dores e alegrias de modo pessoal, individual, singular... nos tornamos os indivíduos únicos que somos em realidade e, por conseguinte, mais capacitados a lidar com nossos limites minimizando nossos dissabores.

Ps: Com carinho para o Higor.

Márcia A. Ballaminut Cavalieri
Psicóloga CRP 06/95124
E-mail: marciabcavalieri@hotmail.com