22 outubro 2018

CERTEZA DA INCERTEZA


"A todo o momento estamos sujeitos a diversos riscos. O risco de nos decepcionarmos, o de morrermos, ou seja, nossas certezas são, na verdade, repletas de “incertezas”."
 
Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, destaca que ferramentas de relacionamento como o Facebook, Twitter, entre outros, possibilitam o “contato” com outras pessoas sem a necessidade de iniciarmos uma conversa, da qual possa apresentar o risco de tornar-se “perigosa e indesejável”. Isso, porque o “contato” pode ser desfeito a qualquer momento, para isso apenas basta que o diálogo se encaminhe numa direção indesejada.
Da mesma forma, conforme afirma Bauman, no nosso mundo “líquido” e moderno somos ansiosos por relacionamentos duradouros, mas ao mesmo tempo queremos que eles sejam leves e frouxos, fáceis e sem frustrações. Ou seja, desejamos nossos sonhos, mas não queremos suas consequências possíveis, o que se pode chamar de contradição.
Em nosso processo de ansiar por algo pode ocorrer, em um número considerável de ocasiões, de relegarmos a um plano que cause menos desconforto a realidade conectada aos riscos em nos relacionarmos. Por isso, torna-se tentador e “seguro” os relacionamentos nos quais temos “total controle”, de modo a podermos nos desconectar a qualquer momento.
No entanto, um desejo um pouco mais rudimentar nos movimenta em direção ao outro. Isto é, buscamos de todas as formas possíveis nos relacionarmos com quem se apresenta ao nosso convívio. E desejamos que tais relações assumam papel duradouro oferecendo segurança. Porém, com as facilidades da atualidade moderna, apresenta-se na mesma proporção a possibilidade de nos colocarmos nessas relações de um modo distante e ilusoriamente seguro. Pois, com a “ilusão” do não se conectar de modo mais intenso também alimentamos a ideia de sermos capazes de não sentir e, por conseguinte, nos privarmos de qualquer sofrimento iminente.
A todo o momento estamos sujeitos a diversos riscos. O risco de nos decepcionarmos, o de morrermos, ou seja, nossas certezas são, na verdade, repletas de “incertezas”, pois podemos estar vivos ou não, nos contentarmos ou não. Mas, ainda assim, colocamos em prática nossa confiança no porvir e na “certeza” deste.
Martin Heidegger, filósofo, salienta vivermos sob o medo do porvir, e esse medo nos conduz a um modo de proteção o qual despreza a possibilidade do fim. Então, desse modo, nos tornamos confiantes e “tranquilos”. No entanto, é necessário nos lembrarmos de tais incertezas de tempos em tempos, para nos habilitarmos a permitir a presença dos riscos em nosso existir.
As relações não nos oferecem certezas, apenas possibilidades. Mas, somos indivíduos que necessitam delas para saciarmos nossa busca pela completude. Sendo assim, ao compreender as “contradições” envolvidas no existir, nos aproximamos da possibilidade de atingirmos realizações pessoais das quais nos permitam uma existência mais próxima da satisfação. Assim passamos a levar em conta que as contradições fazem parte do processo, de modo a nos impulsionar para a continuidade. 

Márcia A. Ballaminut Cavalieri
Psicóloga CRP 06/95124